sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Freedom

A sensação de liberdade é incrível. O seu corpo quase que totalmente fora do seu controle. A sua mente trabalhando a mil por hora, tentando redirecionar o seu corpo, a fim de lhe proporcionar um momento de maior adrenalina.
São apenas 117 metros, mas parecem mil metros quando de está em queda livre. O fluxo de ar no organismo se torna tão difícil quanto se você tentasse gritar depois de alguns segundos com o corpo submerso numa piscina de água fria. A voz não sai. A respiração fica difícil. A pressão que a queda exerce no seu corpo ao chegar ao fim da corda. A elasticidade fazendo você subir de volta e você tentando se equilibrar. A paisagem se misturando em imagens turbas e indefinidas pelos movimentos que a corda faz ao seu corpo. Você não sabe se grita de felicidade ou de medo. Você não sabe se ri ou se chora. Mas sente que é exatamente aquilo que você sempre quis. Era exatamente o que você sempre sonhou pra si.
Liberdade.
...
Nossa Mãe. Acho que hoje vai ser um dia daqueles. Roupas prontas. Acessórios prontos. Documentos prontos. Teste de resistência, de salubridade, de sangue. Só o que me faltava era eu chegar lá e ter esquecido algo. Telefone, dinheiro, câmera. Acho melhor ir de bota que de tênis. De repente faz mais frio que o normal. Bem, deve ser tudo. Mas e se eu esquecer alguma coisa? Isso que é um pensamento de uma pessoa que só não esquece a cabeça porque realmente seria impossível. Não acredito que venha a esquecer de algo dessa vez. Os últimos 30 minutos foram gastos só com a checagem do que eu vou levar. Vamos ver no que dá. Agora é só esperar o “esperto” chegar.
Nossa Mãe. Acho que esse fim-de-semana vai ser um daqueles.
Perece que essa buzina é a minha deixa. Vamos lá. A aventura parece que vai começar e seja o que Deus quiser.
“- E aí campeão. Pronto pra uma aventura inédita na sua vida? - Acho que sim. Ou pelo menos espero, que sim. - Não se preocupe. Nada vai ser muito diferente do que já foi até hoje. Eu quero dizer que vão ser alguns segundos inesquecíveis, mas nada que você não possa lembrar depois e dizer que esperava algo mais. - Eu espero que sim. Tudo pronto aqui. Vamos? - OK. Vamos em frente que atrás vem gente.”
Primeiro a Rota 16 (uma avenida que corta boa parte do Japão, mas não é uma avenida expressa. Também pode ser conhecida por viajar na baixa, já que ela passa no meio das cidades). Uma aventura no horário do rush. Depois a Tomei (essa é outra avenida que corta boa parte do Japão, só que com a diferença de ser expressa. Também é conhecida por viajar na alta, já que boa parte dela passa por cima das cidades). Outra aventura no meio de tantos caminhoneiros e ônibus de passeio. Viajar depois das oito horas da manhã e antes do meio-dia é desse jeito, parece que nunca vai chegar ao destino. Mas não tem problema, ainda é quinta-feira (moku-youbi no japonês e Thursday do inglês) e o fim-de-semana só está começando. O jeito é aproveitar a viagem e tirar algumas fotos das paisagens. Vão ser umas seis ou sete horas até Hiroshima (estado situado ao sul do Japão. Também conhecido por ser o local onde os americanos jogaram uma de duas bombas nucleares na segunda guerra).
Tomara que o próximo P (nas avenidas expressas, existem umas paradas com lojas de conveniência, banheiros, restaurantes e algumas até com lojas de presentes. O termo vem de uma enorme letra P em uma placa situada algumas dezenas de metros antes da entrada do estacionamento) não esteja longe. Eu estou faminto. Deve ser a fase de crescimento.
Crescer pra frente é sempre uma fase difícil na vida de um homem. Devo estar doente, acabei de fazer uma piada. Como se a vida em si já não fosse uma grande piada.
“Como você sabe que um advogado está mentindo? Quando seus lábios estiverem mexendo.”
...
“- E aí campeão, o que você ta aprontando? - Nada de mais. Estou indo pra casa. Onde você está agora? - Saindo de casa. - OK. Quando estiver em casa te telefono. - Onde você está agora? Entrando na estação. - Espera aí. Eu chego em cinco minutos. - OK. Estou na frente do Mac. See ya (gíria, como se dissesse “até mais” ou “te vejo depois”)”.
Caraça. Mal ele chega e já vai jogando uma bomba dessas. Hoje ainda é quarta-feira (tsu-youbi do japonês ou Wednesday do inglês) e já vem um convite pra sumir no fim-de-semana. Parece uma boa idéia. Além do quê, a idéia de não trabalhar nos próximos quatro dias é do meu chefe. Não acredito que ele venha a me demitir por não aparecer no escritório nos próximos dias, já que eu vou estar com ele mesmo.
Vamos ver no que dá. Sempre é boa uma aventura dessas pra sair da rotina.
Convite aceito, agora é hora de ir pra casa.
- O quê você vai fazer em casa agora? - Nada de mais. - Vamos até loja do Ernest, de repente ele convida agente pra jantar. Ouvi mais cedo que ele ia cozinhar hoje. - OK. Vamos ver qual o “menu” (termo vindo do francês, lê-se mení) de hoje.
Depois de um BBQ (termo que significa não exatamente Bar-BQ ou churrasco em inglês) regado a Corona e Bud é hora de ir pra casa e arrumar as coisas pra o dia seguinte.
Espero que não esqueça nada. Esse pessoal é cheio de frescura. Bom mesmo é no Brasil, que quando você esquece algum documento importante, bastam alguns minutos de conversa e uma “molhadinha na planta” que tudo se ajeita. Aqui, se você esquece algo importante, pode dizer adeus ao seu compromisso. Bom ou ruim, o importante é que esse fim-de-semana vai ser “o bicho”.
Ainda tenho que separar as roupas de frio, os acessórios, os “gadgets” (gíria em inglês pra acessórios eletrônicos que se carrega pra cima e pra baixo) pra não perder um momento sequer. Ainda nem amanheceu e a adrenalina já aumente só de pensar. Melhor ir dormir ou eu vou acabar desmaiado a viagem inteira. Parece que está tudo em ordem. Despertador ligado. De manhã eu checo tudo de novo.
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O bom de viajar numa quinta-feira de manhã, é que você acaba tendo a quinta-feira à noite e mais a sexta-feira (kin-youbi do japonês e Friday do inglês) inteira pra curtir a bagaceira antes do fim-de-semana realmente chegar.
Depois de passar seis horas e meia na estrada e mais uns quarenta minutos procurando o hotel, agente se hospeda e desembarca a bagagem. Noite de sono. Muito bom isso.
Amanhece, tomo aquele banho quente, coloco aquela roupa bacana e fico mais uns vinte minutos na frente do quarto ao lado, esperando a donzela terminar de se arrumar. Até parece que vai casar.
Um café-da-manhã digno de reis, um sol de matar de inveja qualquer nordestino (o problema é que o sol aparece com um céu incrivelmente limpo, mas o vento é tão frio que o calor nem surte tanto efeito) e estamos pronto pra se apresentar para umas três ou quatro horas de treinamento para que no dia seguinte não aconteça nada fora do planejado.
Alguns minutos de aula teórica e estamos prontos. Prontos pra o almoço, porque eu estou faminto. De novo. Incrível como cabe tanta comida num abdômen tão pequeno. Depois das duas horas da tarde, retornamos para mais algumas informações teóricas e o chefe de operações nos mostra o procedimento real e mais alguns como dicas. Parece que amanhã vai realmente ser um dia daqueles.
Já passam das dezoito horas. Agora é hora de voltar ao hotel e se preparar pra noite que promete.
Depois de alguns minutos esperando e problemas com a noiva resolvidos. É hora de procurar a balada. Na área sul de Nishi-Hiroshima (cidade metropolitana de Hiroshima, cujo nome é o mesmo do estado. Tipo São Paulo e Diadema) tem uns bares e umas disco (danceteria) com bastante movimento hoje à noite. O negócio certo é encontrar um com diversão e cair dentro. Claro, desde que você consiga dormir um pouco antes das dez horas da manhã. Caso contrário. Imagino que a experiência não vá ser das melhores.
...
Sábado (do-youbi do japonês e Saturday do inglês), onze e quinze da manhã. Os primeiros preparativos já estão sendo finalizados e os bonecos já estão sendo testados. Medidas de segurança. O instrutor fala no interfone e avisa que os primeiros participantes devem estar prontos e esperando segunda ordem na base da torre de lançamento por volta das treze horas.
Todo mundo procura um lugar pra sentar e esperar. Claro, não poderia faltar aquele BBQ pra matar o tempo de espera. Uma carne assada aqui, um frango ali, uma água e um antiácido pra ajudar com a agonia de esperar pra se divertir. Alguns minutos parecem vários dias quando se espera pra fazer pela primeira vez. Parece uma tortura.
O aviso no sistema de som e as pessoas seguem em direção à torre de lançamento. O meu número é o 13 (claro que o treze na realidade é o doze. No Japão não se usa o número 4 “shi” lê-se xi, por motivos de que a pronúncia desse número é a mesma pronúncia do nome de um Deus da guerra e da morte. Definitivamente não é uma boa idéia usar o quatro. Vou ficar com o número treze mesmo), não por superstição, mas por ter tirado na bolha de lançamento. Cada participante tira o seu número e espera a sua vez.
Chega a minha hora. O elevador descendo e a minha circulação sanguínea aumentando. A minha música tocando no sistema de som (isso mesmo, na inscrição você escolhe uma música que vai tocar na sua vez), não por acaso, mas uma montagem da música tema do filme Platoon, outra do filme Hackers, nas mãos do DJ Armin van Buuren, não poderia ser uma pedida melhor. Ainda na subida o pessoal da organização se adianta preparando o equipamento de segurança em mim e ao olhar pra baixo dá pra ver o pessoal dançando ao som eletrônico da minha trilha sonora. Loucura, quanto mais sobe mais eu fico elétrico (definitivamente esse é o termo).
Chega a minha hora. Alguns conselhos e avisos de segurança antes de começar. O instrutor anuncia a minha vez. Eu me viro pra o carinha do meu lado e peço pra que eu faça ao contrário. Ele dá uma risada e pergunta se é a minha primeira vez. Um sorriso muito sem graça e eu falo que sim. Mesmo não concordando plenamente ele explica o procedimento nesse caso.
Eu dou uma olhada na paisagem. Uma respirada bem profunda. Um segundo pra me virar de costas na plataforma. E acontece.
Salto em queda livre. Sem pára-quedas ou colchão de ar. Somente a corda de borracha com as presilhas de fibra e alumínio. O suporte na cintura de material sintético com braçadeiras de fibra de carbono. Botas de borracha e partes sintéticas. Capacete de fibra com a parte interna de algodão e alguma coisa que faz a cabeça ficar bem confortável e um suporte preso ao queixo. Luvas de borracha. Um coração a mil por hora e uma sensação de liberdade incrível. Por alguns momentos você sente que pode voar. Você sente na pele o dom que Deus deu aos pássaros. A incrível leveza do ser.
A sensação de liberdade é incrível. Definitivamente sem explicação. A não ser por uma palavra.

Freedom...

Isso é o que se tem de melhor aqui. No Japão.

2 comentários:

  1. pense em uma pessoa com medo. Não. Com Pânico de altura. É esse seu amigo aqui. E ainda sou fã do Homem-Aranha.Hehehehehee.

    Ps: É no Mato Grosso mesmo!!!!hahahahaha!!

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  2. caraca! adorei de novo! podia ter uma fotinha :) e sobre a trilha: adoro uma musiquinha que toca no filme hackers..será que é a mesma? beijos! (eu nunca teria coragem de fazer uma coisa dessas..:P)

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